segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Humanização

Tá certo que Lucas já nasceu, mas a verdade é que eu nunca escrevi aqui sobre as dificuldades de se ter um parto descente e humanizado aqui no Brasil.



Acredito que a primeira difuculdade está em nós mesmos, pelo menos comigo foi assim. A maior barreira entre eu e um parto humanizado era eu mesma. Cheia de ideia erradas e pré-concebidas, simplesmente repetindo por aí as coisas que ouvia. Tinha pra mim bem no começo da gestação que a cesária com hora marcada era a melhor opção, afinal pra que "sofrer" as terríveis dores do parto? Que mulheres que tiveram parto normal só tem o segundo filho pq nosso organismo faz com que esqueçamos a tamanha dor que foi! Além do que tinha o risco de ficar toda flácida e com uma incontinencia urinária eterna!

Acho que por aí dá pra se ter uma ideia de quão grande era minha ignorância e quão grande foi a muralha que derrubei até saber que tudo isso era papo de mãe desinformada e que caiu na conversa do médico cesarista, sem nem ao menos se questionar e dar uma googlada por aí. Eu mesma estava indo por esse caminho, entregando minha gravidez de mãos beijadas para o médico, sendo totalmente passiva, até que encontrei a luz! E o mais engraçado é que quem ascendeu essa luzinha foi o próprio médico cesarista qdo eu perguntei a ele sobre parto normal. Ele veio com um discurso tão horripilante, me enchendo de medo que na hora eu parei e pensei, e vi que não fazia sentido! Afinal, evolucionista que sou, se fosse tão horrível assim a humanidade tinha acabado no meio do caminho, teríamos sido eliminados pela seleção natural, tamanha era a dor, o desgaste e as consequências de um parto natural. No mesmo dia dessa fatídica consulta, fui pela primeira vez em uma reunião do grupo Samaúma. Nem sabia o que era o Samaúma, achava que era apenas mais um grupo de gestantes, sentadinhas juntas falando sobre as dúvidas da maternidade e  da decoração de quarto de bebe. Tamanho engano... O Samaúma trata-se de um grupo sobre parto humanizado, que luta para que a mulher empodere-se e assuma o papel de protagonista do seu próprio parto e que tenha o direito de viver esse momento de forma humanizada e com dignidade, sendo respeitada e escutada nesse momento!

Saí de lá com a cabeça a mil, era tanta coisa nova, tanta informação errada e preconceituosa que eu tinha, e tantas dúvidas haviam surgido... Minha única certeza era a que eu queria aquilo pra mim, queria vivenciar meu parto, ser protagonista dele, trazer meu filho ao mundo através de um esforço conjunto meu e dele.

Sim, tudo é mesmo lindo no parto humanizado mas não é perfeito. E digo isso pq não é acessível a todas as mulheres que o desejam. Pois depois de vc vencer suas próprias barreiras vc tem que literalmente vencer o mundo! Primeiro as pessoas ao seu redor, pois quem não está dentro desse mundo humanizado dificilmente entende a opção por um parto natural, principalmente se ele for domiciliar. Aí sim é que vão te chamar de doida desvairada que está colocando em risco a vida do próprio filho, mal sabem essas pessoas que se sua gravidez é de baixo risco é até mais seguro nascer em casa longe do ambiente hospitalar, onde há uma chance até maior de infecções.  Sem contar a velha história de pra que sofrer com o parto natural e que essa coisa de não tomar anestesia só pode ser promessa sendo paga. A verdade é que a cesária dói e muito, e digo por experiência própria, e essa dor vai muito além da dor física, principalmente se vc é humanizada. E a briga mais ferrenha de todas é a contra o sistema. No Brasil infelizmente temos altíssimas taxas de cesárias, chegando na casa dos 80% se contarmos apenas a rede particular, sendo que a OMS recomenda uma taxa máxima de 15%. Além disso os partos vaginais feitos no Brasil em sua grande maioria são extremamente intervencionistas, seguindo um protocolo padrão de ocitocina na veia para o TP andar mais rápido, mulheres deitadas na cama e em jejum, estourar a bolsa logo caso a mesma ainda não tenha estourado, analgesia de rotina, episiotomia de rotina e até mesmo uso de fórceps de rotina em alguns hospitais, fora o fato de que a dilatação tem que a contecer rapidamente, caso contrário vc acaba em uma cesária de qq jeito. São raríssímos os lugares em que vc pode ter um parto natural e humanizado, onde vc possa escolher a posição mais confortável, onde as intervenções não são feitas de rotina, mas sim analisadas em cada caso. E mais raros do que os lugares são os profissionais que sabem assistir um parto humanizado. Sendo assim, em sua maioria eles não atendem pelo convênio, afinal um parto humanizado demanda tempo e dedicação,  e não é possível se atender a várias gestantes ao mesmo tempo, existe um número máximo para que cada uma tenha um atendimento intimista e se sinta segura ao lado do médico que escolheu, e o valor pago pelos convênios tanto por consulta qto por parto chega a ser rídiculo! E isso falando dos médicos, pq no caso das parteiras, que para quem não sabe são obstetrizes ou enfermeiras obstétricas, nem mesmo existe essa possibilidade de serem do convenio. Ou seja, vc tem que bancar do seu bolso, e infelizmente não é barato. E por mais que a maioria dos profissionais humanizados facilitem pagamento, a verdade é que a grande a maioria não tem condições de pagar. E muitos dos que teriam condições de pagar ficam em dúvida já que tem convênio e se questionam sobre o pq pagar se pode ser de graça (excessão para quem mora em Campinas, que só não paga se for com o plantonista!). Ou seja, ter um parto humanizado no Brasil é muito difícil mesmo e infelizmente nem sempre basta querer...

O bom é que esse movimento tem crescido cada vez mais, e cada vez há mais profissionais disponíveis (fato que barateia o custo) e tb mais hospitais abrindo espaço para a humanização, embora a parteiras ainda só possam atender em casa, o que é bem diferente do que acontece em países da Europa como França e Holanda, onde o médico só entra em cena em caso de gravidez de alto risco.

Quem acompanha esse blog sabe que infelizmente não pude trazer meu filho ao mundo através de parto natural, pois minha gravidez se tornou de alto risco e por mais que tenhamos tentado o PN não foi possível. Mas mesmo assim sou uma privilegiada em meio a tantas outras mulheres, pois tive a oportunidade de conseguir seguir dentro da minha escolha por uma parto humanizado, agradeço por naquele momento ter tido ao meu lado uma equipe linda e humanizada (obstetra, doulas e neonatologista) que tratou a mim e ao Lucas com todo o respeito e carinho que merecíamos, e que me permitiu vivenciar com alegria àquele momento.

A verdade é que só depende de nós mulheres lutar para mudar essa realidade no Brasil, para que um dia o parto humanizado seja a rotina e que cesárias só aconteçam qdo realmente necessárias.

E pra quem quiser se informar mais:
GAMA
Parto do princípio
Samaúma

Ou então dá um google para "parto humanizado", pois informação é o que não falta, basta apenas filtrar.

Empoderem-se!!!!

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